A Censura no Brasil

A Censura no Brasil ocorreu por praticamente todo o período posterior à colonização do país, seja ela cultural, seja ela política. De certa maneira, mas sob um aspecto diferenciado, o Brasil ainda possui formas de censura desde a redemocratização.

A coroa portuguesa possuía uma listagem de obras que não poderiam circular em seus territórios, incluindo todas as suas colônias. Foram proibidas de circular principalmente obras de teor iluminista ou que criticassem a Igreja Católica e a monarquia absolutista instituída em Portugal. Essa proibição não estava vinculada com a Inquisição, mesmo porque, a fé não era a principal preocupação da coroa naquele momento.

De certa forma, a Inquisição possuiu certo caráter censurador, uma vez que ela investigava, punia e, em alguns casos, matava pessoas que fugissem do pensamento católico, seja por seus atos, seja por suas crenças. Destaca-se que a censura não era um órgão que utilizava métodos investigativos muito apurados para realizar seu trabalho. Bastaria que uma pessoa fizesse uma acusação sem maiores provas que o acusado seria submetido a torturas.

Antes da Inquisição, durante e um pouco depois, os padres catequizadores, cuja grande maioria eram jesuítas, proibiam que os indígenas brasileiros mantivessem vários de seus hábitos, tais como, a antropofagia em algumas tribos, suas festividades religiosas e seus idiomas locais. Foram estabelecidas pelos catequizadores as línguas gerais (tais como o Nheengatu), idiomas por eles criados com base nas línguas de diversas tribos de uma região que deveriam ser faladas por todos os indígenas, a fim de facilitar a comunicação comercial entre os diversos grupos e entre os europeus.

Os escravos também encontravam problemas em relação às suas culturas originais. No entanto, o surgimento dos quilombos (dos quais indígenas e brancos pobres também se beneficiavam) e a criação do candomblé representavam pontos em que poderiam se manifestar. Também era permitido que, em dias de folga, realizassem algumas comemorações, como a "coroação" de reis e rainhas em festividades periódicas.

Censura no período monárquico e início do século XX

Apesar do período monárquico brasileiro ser caracterizado por um regime liberal, as características específicas do mesmo fazem com que o período tenha certas particularidades. Os movimentos de rebelião facilmente repreendidos pelo Estado eram aqueles que defendiam a abolição da escravidão e o poder laico.

Também sofriam certa perseguição todos aqueles que queriam a reunificação das coroas brasileiras e portuguesas, e todas as rebeliões que tentassem tornar determinada região como um país autônomo, sendo que, neste último caso, a Guerra dos Farrapos constitui o exemplo mais notório. Não ocorreram significativas mudanças de resistência cultural entre os indígenas e os escravos no período.

No início do século XX, um dos exemplos de censura mais conhecidos é o do Barão de Itararé. Em 1932, após mais de cinco anos de implacáveis sátiras à sociedade e à política em geral, Apparício é seqüestrado e espancado por policiais da marinha, nunca identificados. Todavia, o episódio não o fez abandonar seu ofício. Mantendo o espírito satírico, afixou o seguinte aviso na porta de seu escritório: entre sem bater.

Censura durante o regime militar

Mas durante o regime militar iniciado em 1964, todas as formas de perseguição são intensificadas, além de outras serem elaboradas.

Após a promulgação do AI-5, todo e qualquer veículo de comunicação deveria ter a sua pauta previamente aprovada e sujeita a inspeção local por agentes autorizados. [2] Obviamente, muitos materiais foram censurados. As equipes envolvidas, impossibilitadas de publicar maiores esclarecimentos, tomavam medidas diversas. Algumas publicações impressas simplesmente deixavam trechos inteiros em branco. Outros, publicavam receitas culinárias estranhas, que nunca resultavam no alimento proposto por elas. Além de protestar contra a falta de liberdade de imprensa, tentava-se fazer com que a população brasileira passasse a desconfiar das torturas e mortes por motivos políticos, desconhecidas pela maioria. A violência do Estado era notada nos confrontos policiais e em conhecidos que desapareciam, mas, não era possível a muitos imaginar as proporções reais de tudo isso. Aparentemente, o silêncio imposto em relação às torturas era para que menos pessoas se revoltassem e a situação se tornasse, então, incontrolável.

Além de censurar as torturas, muitas outras coisas também não poderiam ser veiculadas. Em 15 de setembro de 1972, o seguinte telegrama exemplificador foi recebido pelo diretor da surcusal de Brasília do jornal O Estado de São Paulo

De ordem do senhor ministro da Justiça fica expressamente proibida a publicação de: notícias, comentários, entrevistas ou critérios de qualquer natureza, abertura política ou democratização ou assuntos correlatos, anistia a cassados ou revisão parcial de seus processos, críticas ou comentários ou editoriais desfavoráveis sobre a situação econômico-financeira, ou problema sucessório e suas implicações. As ordens acima transmitidas atingem quaisquer pessoas, inclusive as que já foram ministros de Estado ou ocuparam altas posições ou funções em quaisquer atividades públicas. Fica igualmente proibida pelo senhor ministro da Justiça a entrevista de Roberto Campos.

Dessa forma, a imagem de uma estabilidade política e de uma nação que prosperava era mantida.

Além da resistência ora camuflada, ora explícita da imprensa, artistas vinculados à produção musical encontraram como forma de protesto e denúncia compor obras que possuíssem duplo sentido, tentando alertar aos mais atentos, e tentando despistar a atenção dos militares, que geralmente descobriam que a música se tratava de uma crítica a eles apenas após a aprovação e sucesso entre o público das mesmas. Um dos exemplos mais marcantes do jogo lingüístico e musical presentes do período é a música Cálice, composta por Chico Buarque e Gilberto Gil.

Além do título da composição ter som idêntico à expressão Cale-se, seus versos poderiam ser confundidos com uma divagação religiosa, tal como no trecho transcrito a seguir.

Pai, afasta de mim esse cálice

De vinho tinto de sangue

Como beber dessa bebida amarga

Tragar a dor, engolir a labuta

Mesmo calada a boca, resta o peito

Silêncio na cidade não se escuta

Artistas censurados durante a ditadura militar (1964-1985)

Caetano Veloso

Chico Buarque

Elis Regina

Geraldo Vandré

Gilberto Gil

Kid Abelha

Milton Nascimento

Plínio Marcos

Raul Seixas

Taiguara

Toquinho

Odair José

Torquato Neto

Zé Keti

Canções-protesto

Alguns artistas usavam a própria música para protestar contra a censura. Algumas destas músicas ganharam um caráter histórico dentro do movimento da MPB. Por outro lado, algumas canções eram censuradas apenas por não condizer com os valores morais da época, como é o caso de "Como Eu Quero" de Paula Toller e Leoni, cuja personagem principal exige de seu namorado que "tire essa bermuda". Também é famoso o caso de censura à canção "Tortura de Amor" de Waldick Soriano, lançada no auge da repressão. Outro caso conhecido de censura por razões não políticas foi a imposta a Adoniran Barbosa, que compunha de acordo com o dialeto caipira, obrigado a corrigir as letras de suas canções de acordo com a Gramática, caso quisesse gravá-las. Adoniran preferiu esperar pelo fim da censura prévia para voltar a gravar.

"Apesar de Você" - Chico Buarque

"Pra Não Dizer que Não Falei das Flores" - Geraldo Vandré

"Cálice" - Chico Buarque e Gilberto Gil

"É Proibido Proibir" - Caetano Veloso

"Acorda, Amor" - Leonel Paiva e Julinho da Adelaide (Chico Buarque)

"Que as Crianças Cantem Livres" - Taiguara

"Animais Irracionais" - Dom e Ravel

"Sociedade Alternativa" Raul Seixas

"Opinião" Zé Keti

Censura após a Redemocratização

Mesmo após os militares terem deixado o poder, ainda é possível verificar algumas formas de censura. Muitas ocorrem tendo em vista proteger os cidadãos de atitudes intolerantes, mas, várias outras ocorrem por motivos mais complexos, frutos da persistência do patrimonialismo na cultura brasileira.

Arquivos da ditadura militar

Uma forma direta e indireta de censura é a permanência da grande maioria dos arquivos referentes ao período militar estar inacessível à consulta de advogados, historiadores e da população em geral.

Apenas alguns arquivos estaduais do DOPS (tais como os de São Paulo e os do Rio de Janeiro) já se encontram disponibilizados para consultas, mas, arquivos do mesmo órgão em outros estados continuam lacrados e, em alguns, não se sabe o paradeiro deles.

Os arquivos do DOI-CODI, em todos os estados do país, são dados pelas autoridades como destruídos, o que é contestado por aqueles que possuem interesse em consultá-los. Como exemplo, citam a possibilidade dos arquivos de tal órgão terem sobrevivido por terem sido enterrados, e documentos de outras instâncias que tratavam da Guerrilha do Araguaia que foram publicados após parte deles ter estourado na imprensa.

Outra parte dos arquivos militares encontra-se trancada por decisão do Governo Federal. Com efeito, parte deles nunca será tornada pública, sob a justificativa de se manter a ordem nacional.

Beyond Citizen Kane

Em 1994, o documentário Beyond Citizen Kane, que trata da influência da Rede Globo sobre as decisões políticas no Brasil, tem a sua circulação proibida.

Luís Inácio (300 Picaretas)

A música do grupo Os Paralamas do Sucesso, "Luís Inácio (300 Picaretas)" (batizada a partir de uma frase de Lula em que ele dizia que a Câmara são alguns homem honrados e uma maioria de 300 picaretas), lançada em 1995, fazia protestos sobre a política brasileira, mencionando os anões do orçamento e a corrupção geral. O deputado mineiro Bonifácio Andrada se indignou, vetou a música em um show em Brasília e lançou um protesto no Congresso, querendo proibir a canção (o que a imprensa logo considerou anticonstitucional). O processo não deu em nada,apenas vetaram a exibição de "300 Picaretas" em rádios e lojas de discos.

A polêmica toda ajudou os Paralamas a voltarem para os holofotes após um período obscuro.

Documentário "Di Cavalcanti", de Glauber Rocha

O documentário "Di Cavalcanti" (1976), um curta de 18 minutos realizado pelo cineasta Glauber Rocha numa homenagem ao pintor brasileiro Di Cavalcanti (1897-1976), por ocasião de sua morte, teve sua divulgação no Brasil proibida judicialmente a pedido da filha de Di. No filme, foram incluídas algumas cenas do velório de Di no Museu de Arte Moderna (MAM) do Rio de Janeiro, bem como de seu enterro. Segundo matéria publicada na Folha de São Paulo, o sobrinho de Glauber, João Rocha, teria driblado a proibição colocando o vídeo na Internet em provedores fora do Brasil, para o internauta baixar livremente).

Correio Braziliense

Em outubro de 2002 o jornal Correio Braziliense é proibido de publicar, com possibilidade de busca e apreensão de eventuais exemplares já impressos, uma matéria que divulgaria trechos de escutas telefônicas de funcionários do "alto escalão" do governo do Distrito Federal. De acordo com o jornal, tais pessoas estariam envolvidas com processos ilegais de loteamentos de territórios. Em protesto, o jornal publicou matéria alegando ter sido censurado e, no dia seguinte, seus diretores de redação pediram demissão.

Requerimentos do governo ao Google

No dia 20 de abril de 2010, o Google lançou uma ferramenta que mostra o número de requerimentos feitos pelos governos de diversos países diretamente ao Google ou ao YouTube. Intitulada Government requests (requerimentos governamentais), a ferramenta mostra um mapa do mundo com o número de requerimentos realizados por alguns governos para remoção de conteúdo ou obtenção de material de acesso restrito. Os dados apresentados no dia do lançamento são de 1º de julho de 2009 à 31 de dezembro de 2009. O governo brasileiro aparece como o que mais enviou requerimentos, tanto para remoção de conteúdo como para obtenção de material restrito.

Um exemplo da atuação do governo brasileiro é a censura ao sítio euqueroserra.blogspot.com, hospedado pelo Google. Em 16 de junho de 2010, o Ministério Público Eleitoral (MPE) entrou com uma ação contra o Google para que o blog fosse tirado do ar e os autores fossem identificados. A alegação foi de que o blog continha propaganda em favor do candidato José Serra. Ação semelhante foi movida contra o sítio amigosdopresientelula.blogspot.com. Nesse caso, o blog era em favor da candidata Dilma Rousseff.

Censura do Livro Minha Luta

O livro Minha Luta escrito por Adolf Hitler foi proibido de ser comercializado até o ano de 2015. Isto foi por imposição do governo Alemão junto a sua embaixada no Brasil. Este livro já foi normalmente comercializado desde os tempos que os nazistas estavam no poder (Primeira edição em 1934) até 2005 pela editora Centauro.

Censura de jogos eletrônicos

Apesar de o Ministério da Cultura considerar jogos eletrônicos obras culturais e de expressão, aparentemente não existe nenhum movimento público contra a proibição de jogos no país.

Counter-Strike

O Wikinotícias tem uma ou mais notícias relacionadas com este artigo: Counter Strike e EverQuest estão proibidos no Brasil.

Desde de 18 de Janeiro de 2008, a comercialização de livros, encartes, revistas ou CD-ROM, contendo o jogo Counter-Strike está proibida em território brasileiro pois é muito violento, conforme decisão da justiça do país. O juiz responsável argumenta que Counter-Strike e o jogo EverQuest "trazem imanentes estímulos à subversão da ordem social, atentando contra o estado democrático e de direito e contra a segurança pública, impondo sua proibição e retirada do mercado". A empresa responsável do jogo alegou que a fase que o juiz utilizou como motivo para proibir a venda a cs_rio e que de fato foi produzida por fãs, não estando contida no jogo original. Porém, o juiz Silva Costa Torta ganhou a ação e o jogo está proibido de ser vendido. Ainda é possível, no entanto, utilizar o gerenciador Steam para comprar eletronicamente qualquer versão do jogo. Como a comercialização foi proibida, a própria censura falhou, pois a versão 1.5 e anteriores são grátis, portanto não são comercializáveis, portanto continuam de livre circulação.

Duke Nukem 3D

Em 3 de novembro de 1999, um estudante de medicina Mateus da Costa Meira, então com 29 anos, matou três pessoas e feriu outras quatro durante uma sessão do filme "Clube da Luta" em um cinema de São Paulo. Mateus ficou conhecido como "o atirador do shopping". Foi condenado em 2004 a 120 anos de prisão. Em depoimentos ele teria citado o jogo Duke Nukem 3D, que traz um cinema em um trecho da primeira fase. Mesmo quase quatro anos depois de lançado, o jogo teve a venda proibida.

Censuras por Valores

Bidê ou Balde

No ano de 2005, um conjunto musical do Rio Grande do Sul, Bidê ou Balde, passou a enfrentar problemas judiciais. A música "E por que não?", do conjunto, selecionada para uma coletânea da MTV, possui letra acusada judicialmente de fazer apologia à pedofilia. Em entrevista dada ao sites Vagalume (Uol), em 25 de julho de 2006, o vocalista Carlinhos Carneiro disse que: "Eu só acho que a interpretação de uma obra de arte não é do autor e sim de quem está recebendo a obra, algo totalmente subjetivo e para mim o legal é a liberdade das pessoas terem diversas interpretações da mesma música". A música teve sua execução proibida.

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