CPI - Extermínio no Nordeste

Foi caracterizado que o crime organizado não existe sem a presença de segmento do Poder Público, não havendo lugar, no que diz respeito ao tráfico de drogas, ao roubo de cargas e ao grupo de extermínio que não tenha o envolvimento do Poder Público, em grau variável conforme o Estado, podendo envolver Parlamentares, Juízes, Desembargadores, Promotores, a alta cúpula das Secretarias de Segurança Pública e/ou de Defesa Social, empresários e policiais civis e militares.

Todavia, há dificuldades óbvias para que investigações alcancem personalidades desse naipe e, mais ainda, de sancioná-las quando se conseguem indícios mais consistentes, com um delegado tendo se queixado de ter instaurado um inquérito policial contra uma pessoa importante em determinado Município e, por isso, ter recebido transferência para outra atividade.

Também foi citado que o Brasil gasta 10% do seu PIB com a questão da violência, aí somados todos os investimentos públicos e privados, computando-se perda de vidas, gastos com a Previdência, pessoas mutiladas, dias de trabalho perdidos, seguros, cargas roubadas e várias outras.

O que se tem hoje é uma estrutura profissional, mafiosa mesmo, infiltrada na vida econômica, na ordem social, na Administração Pública e na Justiça, em plena promiscuidade de setores do poder político e econômico com o crime organizado, assumindo o comando do Estado e sangrando o País, paquidérmico em sua estrutura burocrática, sem a necessária agilidade para enfrentar o crime organizado, deixando a sociedade refém de toda espécie de bandidos - desde o jovem infrator ao delinqüente engravatado que freqüenta as altas rodas sociais sob as benesses da corrupção que campeia endêmica.

Realmente preocupa o número e a importância de autoridades envolvidas, direta ou indiretamente, com criminosos, permitindo a idéia que existe uma ação orquestrada pelo crime organizado para tomar, paulatinamente, os poderes constituídos, com a corrupção sendo o ponto de contato mais visível entre o crime organizado e o aparelho estatal.

As autoridades envolvidas com as execuções sumárias representam o velho "coronel" de outrora, seja como protetor, como mandante ou como usuário de outros serviços prestados pelos matadores, como o de proteção pessoal ou mesmo para o cometimento de homicídios associados a outras práticas delituosas em que estão envolvidos.

Quase sempre, entre essas personagens de maior hierarquia e os matadores, há a figura do intermediário ou o agenciador, que torna remota a possibilidade de que a investigação policial possa estabelecer os vínculos entre as duas pontas do sistema - mandantes e matadores - e faz com que seja praticamente impossível alcançar os primeiros.

Mais ainda, pela relevância que têm algumas personalidades, muitos dos processos passam a correr em segredo de justiça, fazendo com que a sociedade e outros organismos percam a capacidade fiscalizatória pela falta de transparência, nada se sabendo a respeito.

Ao lado da infiltração do crime organizado no aparelho policial, o que não significa que ela também não exista nas outras instituições, percebe-se que o Poder Judiciário precisa ser resgatado nas suas funções e na sua credibilidade, deixando de entravar o desenvolvimento do Estado Democrático de Direito, na medida em que a sua morosidade transforma-o em uma instituição muito fragilizada e, até mesmo, despreparada para uma sociedade do século XXI, deixando antever considerável atraso e vícios da supremacia de poder. O brasileiro está descrente na Justiça e enxerga que grande parte da impunidade reinante advém da incapacidade do Poder Judiciário de julgar com rapidez e rigor.

Pondera-se se realmente, é o caso mudar a gradação das penas, considerando que "30 anos é uma vida", fazendo com que, melhor do que o aumento das penas, haja maior celeridade na aplicação do Direito Positivo brasileiro, pois os sucessivos recursos só aproveitam aos delinqüentes, e não à sociedade, com a procrastinação da persecução criminal, pela pulverização do bom andamento do processo, permitindo que, ao chegar ao final, o clamor social tenha diminuído em sua intensidade e a sociedade já não tenha a resposta esperada.

Também se defronta com arremedos de julgamento, com sentenças previamente encomendadas, apenas para salvaguardar as aparências de que a justiça está sendo cumprida.

Não se pode perder de vista que magistrados e promotores, particularmente nas cidades do interior, muitas vezes estão abandonados, temendo pelas suas vidas e a dos seus familiares e encontrando restrições para que possam trabalhar a contento.

Os pontos de contato dos grupos de extermínio com a política ficam bem realçados quando se percebe que, em muitas regiões, os índices de execuções sumárias têm considerável aumento nos anos eleitorais.

A formação histórica da polícia brasileira levou-a a ser o que ela é hoje, havendo a participação do agente público, principalmente da área de segurança pública, na questão das execuções sumárias e em outras formas de criminalidade.

Há Estados em que policiais civis estão diretamente engajados aos grupos de extermínio; em outros, são policiais militares; e, em mais outros, indistintamente policiais civis e militares. Quando não estão diretamente associados às execuções, aparecem indiretamente, acobertando, protegendo, patrocinando os matadores.

Regra geral, não se percebe a existência de mecanismos de controle eficientes sobre as polícias porque as corregedorias e ouvidorias não têm funcionado a contento, muitas vezes comandadas por elementos oriundos das próprias instituições fiscalizadas e, por isso, contaminados pelo vício do corporativismo, fazendo com que o Estado não tenha o controle efetivo sobre suas polícias.

Ainda que não necessariamente envolvidos com grupos de extermínio, nota-se uma relação fortemente promíscua entre policiais e os grupos de segurança privados, de modo que o mau desempenho funcional daqueles, enquanto agentes de segurança do Estado, serve para alimentar e justificar a existência dos grupos privados suprindo as lacunas deixadas, com muitos, mesmo na ativa, prestando, de forma clandestina, seus serviços à segurança privada.

No curso da CPI foi colocado que, apesar dos intensos investimentos feitos na área da inteligência policial, essas informações privilegiadas têm sido empregadas em favor do crime organizado, com policiais que têm acesso a elas aproveitando-se para auferir vantagens pessoais, inclusive pela extorsão das quadrilhas em troca da impunidade das mesmas.

Há Estados em que agentes condenados, ou submetidos a regime prisional por razões outras, circulam livremente, acoitados pela cúpula do próprio sistema e pelo corporativismo que campeia nos estabelecimentos onde são recolhidos. O fato de não levá-los aos estabelecimentos prisionais convencionais, sob a justificativa de não deixá-los expostos à ação de criminosos comuns, tem deixado esses policiais livres, inclusive para o cometimento de outras ações delituosas, havendo notícias de crimes de mortes cometido por policiais, ou ex-policiais, que, sabidamente, saíram dos locais onde deveriam estar recolhidos, mas que oficialmente, dali nunca se ausentaram, em um álibi legalmente perfeito.

Há unidades da federação em que a luta contra os grupos de extermínio é dificultada pela própria postura de algumas autoridades, que se recusam a admitir a existência do crime organizado e de grupo de extermínio no âmbito dos seus Estados. Também há casos de Governadores que anunciam que têm, nos seus Estados, o programa de proteção à vítima e à testemunha, mas, na realidade, não assumiram, nem têm o programa, nada fizeram nem contribuem para isso. Essas posturas deixam interrogações, particularmente sobre a quem interessa negar a existência desses grupos organizados para a prática de homicídios, contrariando todas as evidências.

Muitos dos grupos de extermínio iniciam suas atividades com a execução sumária de jovens infratores, para que não perturbem o funcionamento do comércio (supermercados, farmácias, shoppings centers etc.), indo em um crescente que vai se associando, em grau maior de organização, de complexidade e de envolvimento, com outros tipos de crime: roubo de cargas, tráfico de drogas, tráfico de armas, crimes do "colarinho branco", lavagem de dinheiro, sonegação, assalto a banco, assalto a carro-forte, roubo de caminhões etc., chegando a se articular com políticos e policiais, sendo, mesmo, encontrados integrantes de grupo de extermínio como guarda-costas de alguns políticos.

Fica a impressão que, no lugar da pistolagem tradicional, cada vez mais vêm sendo utilizados jovens para realizar as execuções sumárias, uma mão-de-obra mais barata no mundo do crime.

O País vem perdendo considerável quantidade de jovens para o crime, seja como agentes do próprio crime, seja como vítimas de execuções, em uma realidade duríssima e um processo crescente.

Na verdade, em pleno século XXI, percebe-se, no Nordeste, e mesmo em todo o Brasil, uma mescla de costumes herdados de outros tempos com modelos importados das quadrilhas mafiosas, em que já não se distingue perfeitamente a figura do pistoleiro sujeito a um código de honra, do justiceiro e do assassino profissional a serviço de quadrilhas, as mais várias; em que o cavalo foi substituído pela moto como meio de transporte e de execução dos assassinatos. Na verdade, os matadores, hoje, estão a serviço do crime organizado nas queimas de arquivos, nos acertos de contas, nas vinganças e nas pistolagens.

Também fica evidente o papel que alguns advogados vêm desempenhando junto aos criminosos e às organizações criminosas, não mais de causídicos propugnando pelo restabelecimento da justiça, mas de verdadeiras mãos-de-obra a serviço do crime, utilizando-se das suas prerrogativas profissionais.

Evidentemente que há grupos que têm ação menor, mais limitada, e existem aqueles em que as suas articulações permitem-lhes maior projeção.

Também há Estados que têm mais de um grupo de extermínio atuando, normalmente cada um com seu território delimitado e respeitando o do outro e, por vezes, até trocando colaboração, não só nos limites da divisa estadual, como também com grupos de outros Estados.

Quando não há a colaboração efetiva de criminosos de um Estado com outro, existe o trânsito entre as divisas, de modo que criminosos em fuga de um Estado vão em busca de guarida em outro.

Em que pese os limites da CPI terem ficado restrito aos Estados do Nordeste, foi possível perceber que o fenômeno dos grupos de extermínio não está limitado aos Estados dessa região, tendo lugar, em maior ou menor escala, no Brasil todo, não sendo o caso descartar a ligação de grupos criminosos do Nordeste com localidades de outras regiões do País.

Ainda que não diretamente ligado a execuções sumárias, mas sem descartar a hipótese de também alcançar essa prática, foi trazido ao conhecimento da CPI, por Delegado da Polícia Federal, de uma quadrilha que havia praticado, desde outubro de 2003, 18 assaltos a banco na Bahia; 5, em Sergipe; e 7, em Alagoas. Cerca de 60 homens em grupos temporários de três ou quatro quadrilhas, atuando abertamente e fortemente armados, com base em Belém (PA), no interior de Pernambuco, no Espírito Santo e em Vitória da Conquista (BA), e lavando o dinheiro roubado em oficinas mecânicas, imobiliárias, fabriquetas de confecções etc.

Também transparece a existência de milícias fortemente armadas por proprietários de terra, muitas vezes com o envolvimento de integrantes de grupos de extermínio, sendo de se crer que a origem desse armamento passe pelo tráfico internacional de armas.

Dificilmente se encontra uma organização criminosa cujo fim seja o da execução sumária apenas pela execução. O que se vê, quase sempre, é a execução sumária inserida como atividade subsidiária das estruturas criminosas - narcotráfico, contrabando, disputa por mando de território, milícias privadas etc., de modo que o extermínio não age desarticulado de um grupo maior, o crime organizado.

Desse modo, a luta contra o crime organizado estará, paralelamente, combatendo os grupos de extermínio, não sendo possível pensar no controle da execução sumária sem um combate e uma estratégia de combate ao crime organizado como um todo.

No bojo de todas essas considerações, percebe-se que a ação dos Governos dos Estados e do Governo Federal não tem resgatado setores marginalizados da sociedade, não acontecendo políticas sociais efetivas. Por isso, ao lado da repressão e da ocupação policial, torna-se necessária a ocupação social e cultural, esvaziando o crime organizado da farta disponibilidade de mão-de-obra, representada, particularmente, por uma considerável quantidade de jovens pobres, sem qualquer outra possibilidade fora do caminho do crime.

Mas também há a ausência dos Estados em atividades preventivas e repressivas da Polícia quando se observam regiões críticas sem a presença de delegacias policiais ou, quando existem as delegacias, de policiais militares e agentes de polícia civil fazendo às vezes do delegado, comprometendo a eficiência do aparelho policial e a qualidade da investigação policial. Isso sem dizer da figura do "araque" de polícia, indivíduo sem qualquer qualificação e sem vínculo oficial travestido de agente policial e oficiosamente tolerado.

Também há o abandono do policial a sua própria sorte, principalmente em algumas cidades do interior, onde é total o desamparo, não existindo treinamento nem reciclagem.

Na verdade, o bom policial está colocado entre vários fogos: o do enfrentamento direto dos bandidos, nas ações de rua; o dos colegas associados aos crimes, no quadro de corporativismo; o dos bandidos e seus cúmplices, que ameaçam o policial e seus familiares; e o de ver processado pelo resultado das suas ações, que nem sempre, no calor dos embates, poderão ser dosadas em limites aceitáveis aos olhos dos que desconhecem a realidade da vida policial.

Tudo isso faz que muitos, procurando preservar-se, refugiem-se nas atividades burocráticas, muito mais confortáveis e sem os riscos inerentes à atividade-fim.

Esse abandono se reflete também na qualidade dos inquéritos policiais, normalmente pobres em provas que permitam, posteriormente, uma ação eficiente do Ministério Público e do Poder Judiciário.

As denúncias, quase sempre desprovidas de provas técnicas, tornam-se frágeis e criminosos contumazes, de alta periculosidade, terminam por serem absolvidos porque denunciados unicamente com base em provas testemunhais.

A Polícia Científica está desaparelhada, pouco capacitada, com baixíssima possibilidade de identificação de autoria, com muitos inquéritos ficando sem a identificação de autoria e, por vezes, até das vítimas.

Os inquéritos, muitas vezes são malfeitos, alguns sequer iniciados, laudos cadavéricos são emitidos por médico de um hospital da cidade que não tem especialidade, exames balísticos que não são feitos, exames de local que não são feitos ou locais de crimes que são alterados antes da presença da perícia. Os inquéritos malfeitos podem ser explicados pela falta de meios, pelo desinteresse ou incompetência da autoridade policial em bem conduzi-lo e, mesmo, pelo interesse da autoridade policial em conduzi-lo mal, atendendo a interesses escusos, que vão desde o corporativismo, quando alcançando colegas de atividade policial, até o conluio com os criminosos alcançados pelo processo investigatório.

Existem casos de os mesmos delegados suspeitos serem, sistematicamente, designados para a condução de inquéritos que merecem especial importância.

Por sua vez, as provas testemunhais, ao lado das fragilidades que lhes são inerentes, no caso dos grupos de extermínio e do crime organizado, têm essa fragilidade aumentada consideravelmente porque testemunhas são caladas pela sua eliminação pelo seu amedrontamento, sendo comum substanciais modificações entre o depoimento prestado perante a autoridade policial e aquele que se faz, posteriormente, em juízo, mudando o testemunho e levando a consideráveis atrasos no desenrolar o processo judicial.

Em que pese críticas que podem ser despejadas sobre a atuação de determinados integrantes dos Ministérios Públicos, estas, pelo que se pôde observar, não se dão pela omissão e leniência que têm caracterizado todas as outras instituições - desde as que compõem o aparelho policial até o Poder Judiciário -, mas por excessos cometidos.

Parece ser muito mais fácil policiar os excessos dos Ministérios Públicos, canalizando sua energia, do que a omissão e a leniência de outros. Afora isso, muito do que se tem feito no combate ao crime no País, particularmente ao crime organizado, deve ser creditado a Ministérios Públicos atuantes, altivos, corajosos, inquietos na sua luta contra o crime. Limitar a sua atuação, a título de interpretações de normas constitucionais e legais, seria dar guarida ao crime organizado.

Nota-se a falta de integração entre as atuações das Polícias, do sistema penitenciário, do Ministério Público e do Poder Judiciário e, dentro deste, entre as suas instâncias, fazendo que, no lugar de ações sinergéticas para coibir a criminalidade, haja ações diversas e desconexas, muitas vezes sob influências de indiossincrasias e de corporativismos que só aproveitam aos delinqüentes, e nunca à sociedade.

Há, mesmo, um imobilismo do aparelho estatal que deveria coibir a atuação de todas as modalidades criminosas, havendo ocasiões em que esse aparelho ostensivamente se omite ou parece, de forma deliberada, provocar embaraços para que nada se apure, ficando a dúvida se o Estado está imóvel ou propositadamente imobilizado.

Houve promotor que disse ser mais difícil enfrentar o Estado, a omissão do Estado, a sua letargia, do que a própria criminalidade, e que não entendia isso como falta de vontade política, mas que a vontade política era justamente a de causar embaraços, atrapalhando as apurações.

O quadro a seguir - meramente exemplificativo, podendo ser acrescido de outros parâmetros -, colocando em pólos antagônicos as forças legais e as forças a serviço do crime, faz uma comparação que mostra, de forma extremamente ácida, como as primeiras vêm rapidamente perdendo terreno para o crime organizado.

FORÇAS LEGAIS

FORÇAS CRIMINOSAS

Poder dividido em vários níveis (Polícia Judiciária, Ministério Público, Poder Judiciário nas suas várias instâncias).

Poder concentrado em um só nível (o chefe da quadrilha).

Difusão de esforços (cada instituição apontando seus esforços não necessariamente para o mesmo objetivo, inclusive as diversas instâncias do Judiciário).

Concentração de esforços (toda o esforço é coordenado e dirigido para um único objetivo).

Diversidade de comando.

Unidade de comando.

Diversidade de pensamento e de ação.

Unidade de pensamento e de ação.

Ações limitadas pelas determinações administrativas, legais e judiciais, bem como pelas pressões da sociedade.

Plena liberdade de ação.

Falta de integração entre as diversas instâncias.

Possibilidade de atuar sucessivamente em diversas instâncias

Carência de recursos materiais e financeiros, dependendo do poder público.

Fartura de recursos materiais e financeiros, obtidos ilegalmente, qualquer que seja a fonte.

Sujeitos passivos da corrupção.

Sujeitos ativos da corrupção.

Esforço pessoal não necessariamente vinculado à atividade profissional.

Esforço pessoal concentrado em prol da atividade delituosa.

Ação intermitente (dependente dos horários de expediente e a folgas de férias, feriados e fins de semana).

Ação permanente (independente de horário e de ser dia útil ou não).

Ações retardadas (dependentes da burocracia estatal).

Ações imediatas (independentes de qualquer burocracia).

Agente passível de se ver processado por qualquer deslize, ainda que não intencional, e tendo que custear os honorários de advogado às suas próprias expensas, ainda que a sua ação tenha sido em nome do poder estatal.

Delinqüente, se processado, dispondo das melhores bancas de advocacia, normalmente custeadas pelas forças ocultas do crime organizado.

Há formas variadas no modo de realizar as execuções pelos grupos de extermínio, mas existem algumas características que se repetem com maior freqüência, com o emprego dos seguintes meios:

· disparos com armas de fogo;

· uso de motocicletas;

· emprego de celulares;

· capacetes ou balaclavas (capuzes) cobrindo a cabeça;

Para dificultar, as investigações é comum a prática da desova, com alguém, assassinado em um município, tendo o seu cadáver lançado em outro, e também o intercâmbio entre grupos de extermínio, com um grupo praticando, na área de outro, a execução em favor deste.

É patente que, com a contenção dos grupos de extermínio, aumenta assustadoramente o índice dos furtos, assaltos e outros delitos que colocam a população sobressaltada, pois os delinqüentes que eram expulsos da área em que os grupos atuavam, quando não, mortos, passam a sentir-se à vontade para cometerem delitos. A fragilidade do aparelho de segurança do Estado, nesse momento, faz que com as pessoas comuns se tornem simpáticas aos grupos de extermínio.

Muitas das vezes, para justificar a existência do grupo de extermínio, este mesmo patrocina as ações dos adolescentes infratores.

O perfil das vítimas dos grupos de extermínio é extremamente variado, mas podem ser elencados como os mais comuns:

· adolescentes em conflito com a lei, assassinados porque praticaram pequenos delitos, porque estão vinculados à droga ou porque se tornaram empecilhos para o grupo e são eliminados como queima de arquivo;

· ex-detentos e outros indivíduos recém-libertados de estabelecimentos prisionais;

· vítimas da luta interna em uma mesma quadrilha ou entre quadrilhas na briga por pontos de drogas, por domínio de território ou pela destinação do produto de roubo;

· vítimas por queima de arquivo, são contratadas para executar uma pessoa e depois são mortas a mando de quem os contrataram;

· defensores dos direitos humanos;

· trabalhadores rurais, lutando pelo direito às terras;

· vítimas de disputas políticas;

· homossexuais (em menor escala).

Regra geral, os grupos de extermínio nascem sobre o signo de prestar segurança privada ao comércio e a residências, como a famosa "turma do apito", evoluindo para segurança de uma porção maior do município, passando à extorsão de comerciantes e munícipes em troca de proteção, depois, pistolagem sob encomenda, seguindo-se o domínio do sistema público de segurança pública do município, o tráfico de drogas e de armas e, mais à frente, todas as demais modalidades ilícitas que se possa imaginar: cobrança de dívidas mediante ameaças, roubos de cargas, seqüestros, assaltos, desmanches de veículos, crimes fronteiriços e assim por diante, em uma organização criminosa com um número diversificado de atividades.

A criminalidade, cada vez mais, está se enraizando em pequenas cidades, onde se observam muitas pessoas enriquecendo de um momento para outro, evidentemente de forma ilícita, e nada tem sido feito.

A uma crescente evolução dos grupos criminosos, a olhos vistos, sem que nada ocorra, sem que nenhum freio, sem que o Estado dê uma resposta, havendo o comprometimento das instituições dos lugares onde esses grupos atuam, através da interação com a política, com a sociedade, com a economia e, até mesmo, com a cultura do município, envolvendo corrupção, apadrinhamento, financiamento de campanhas políticas e tudo o mais que se possa imaginar, estabelecendo o domínio político ou econômico ou social da região.

Sala da Comissão, em 22 de novembro de 2005.

Deputado BOSCO COSTA

Presidente

Deputado LUIZ COUTO

Relator

Fonte: Relatório final da comissão parlamentar de inquérito do extermínio no Nordeste.

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