O poder da terceira idade
Idosos brasileiros formam um grupo de 15 milhões de consumidores mal atendidos
Eles não se enquadram em estereótipos de vovôs que praticam esportes radicais nem de velhinhos abandonados em asilos. Os idosos brasileiros formam um grupo muito heterogêneo de 15 milhões de consumidores (14% da população adulta), que deve chegar a 30 milhões de pessoas até 2020, a maioria mulheres, com uma renda que soma R$ 7,5 bilhões ao mês, o dobro da média nacional, e que têm muito mais poder de influenciar hábitos de consumo nas famílias do que se imagina. Estas são algumas das principais conclusões de uma pesquisa inédita no Brasil sobre o perfil da terceira idade, o Panorama da Maturidade, que acaba de ser concluída pela Indicator GfK após dois anos de trabalho.
A pesquisa ouviu 1,8 mil homens e mulheres com mais de 60 anos nas grandes regiões metropolitanas do País e em Goiânia e Brasília. O objetivo foi investigar o perfil dessa parcela da população, buscando conhecer características de comportamento, gastos, saúde, alimentação, moradia, transporte, educação, cultura, lazer e consumo de mídia. O seminário Terceira Idade - Panorama Social de um Mercado em Expansão, realizado em São Paulo, discutiu a questão com especialistas de várias áreas que se envolveram na pesquisa.
Os dados levantados mexem com a imagem tradicional dos velhinhos-problema. Ao contrário, são eles os responsáveis pela manutenção de 25% dos lares nacionais, ou seja, 47 milhões de domicílios. De cada cem entrevistados, 68 declaram ser responsáveis pelas decisões de compra da família.
Apenas 15% deles não têm renda alguma. Já a renda média mensal dessa parcela da população é de R$ 866. E eles estão em maior número na classe A/B do que a média nacional, segundo levantamento da Associação Nacional das Empresas de Pesquisa de Mercado (Anep). Trinta e um por cento dos idosos pesquisados fazem parte dessa classe, contra 29% do total nas regiões metropolitanas. E também estão em menor número na classe D/E - 34% na pesquisa contra 35% considerando-se toda a população avaliada pela associação.
"Tradicionalmente, as pesquisas de mercado descartam as opiniões daqueles com mais de 60 anos, desprezando uma parcela da população que se revela mais importante nas decisões do lar do que se imagina", diz Paulo Cidade, sociólogo e gerente da Indicator GfK, responsável pelo estudo. "As entrevistas revelaram que os idosos têm um caráter fortíssimo de formadores de opinião, geralmente cuidam dos netos para que os filhos possam trabalhar, influenciando assim toda a família", completa ele.
Um dos conceitos centrais utilizados na análise dos dados é que a terceira idade não acontece de uma hora para outra, ela tem um caráter de processo, já que as pessoas não se transformam de repente ao passarem dos 60. "Portanto, o aspecto heterogêneo desse grupo não é diferente do resto da sociedade e isso é fundamental na hora de pensarmos estratégias de comunicação que incluam essas pessoas", diz Cidade. "Será que, em vez de vender imagem de beleza, não seria interessante pensar em elegância, que inclui as pessoas mais idosas?", questiona.
Outro dado que aparece nas entrevistas é que a visão negativa da velhice, que permeia a sociedade em geral, também está entre aqueles que já chegaram nela e, portanto, há uma grande aversão à rotulação de terceira idade. Esses consumidores revelaram um desejo de ser incluídos, e não separados dos demais cidadãos na hora de se verem retratados pela mídia. Afinal, eles são fortes consumidores de produtos de comunicação. Entre as atividades que mais fazem dentro de casa, assistir à televisão vem em primeiro lugar, seguida de ouvir rádio: 87% dos entrevistados assistem à televisão diariamente e 59% ouvem rádio todos os dias. No levantamento semanal, o hábito é ainda maior, 92% assistem à televisão ao menos uma vez por semana e 72% ouvem rádio nesse período. A leitura de jornais e revistas também está entre as atividades mais freqüentes.
As maiores despesas dos idosos são com o supermercado, 24% do total de gastos. Em seguida vêm os gastos com planos de saúde, 9%, e com luz e telefone, ambos representam 6% do orçamento. Nas despesas pessoais, a compra de remédios tem o maior peso, 10%, e em seguida vêm as viagens, 5%. Mais da metade desses idosos fez ao menos uma viagem no último ano.
Dos entrevistados, 45% têm plano de saúde. "Isso significa que o crescimento acelerado dessa parcela da população tem grande impacto também nas políticas públicas, já que mais da metade dos idosos depende dos serviços de saúde do governo", acrescenta Paulo Cidade. A questão da previdência, tanto pública como privada, também terá grande influência na vida da terceira idade. Hoje apenas 1,3% dos idosos vive com aposentadoria privada, e 86% do restante nunca pensou nisso, o que indica um enorme mercado potencial para os jovens de hoje.
"As próximas gerações chegarão a essa idade de outra forma, com outros tipos de retaguarda financeira, e é isso que o mercado precisa antever. O grande objetivo da pesquisa é fornecer informações estratégicas para grandes corporações que devem se preparar para futuras transformações sociais", completa o sociólogo.
A pesquisa chegou a oito grandes grupos de perfis com as características pessoais e de estilo de vida dos idosos. Esse refinamento, que vai além dos números, nunca havia sido mapeado no Brasil e pode fornecer valiosas informações para pensar se estratégias de marketing tanto para as atuais gerações de jovens, que em breve farão parte dessa parcela, como para os idosos. "Podemos concluir que há um grande mercado potencial de produtos específicos para a terceira idade, como também há uma grande necessidade de readequar os produtos e serviços que já existem para atender também os idosos", diz Paulo Cidade. Um dos problemas levantados pelos entrevistados na hora das compras, por exemplo, é a dificuldade de ler rótulos.
Fonte: Revista Meio & Mensagem