Uma organização que ajuda a encontrar abrigos para moradores de rua, um aplicativo que permite a pequenos criadores monitorar seus rebanhos e um projeto que leva aulas sobre a Constituição a escolas públicas são algumas das iniciativas gerenciadas por brasileiros e selecionadas por um programa do governo dos Estados Unidos que incentiva a inovação.
Lançada pelo presidente Barack Obama neste ano, a Young Leaders of the Americas Initiative (iniciativa para jovens líderes das Américas) escolheu 250 jovens da América Latina e Caribe que desenvolveram propostas inovadoras para problemas sociais.
Custeados pelo governo americano, os jovens viajaram para os Estados Unidos em outubro para conferências e fizeram um estágio de um mês em organizações que atuam nas suas áreas. O programa termina em 2017, quando os anfitriões visitarão os jovens selecionados em seus países.
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A BBC Brasil entrevistou cinco dos 20 brasileiros que participam do programa. Confira seus projetos:
Felipe Neves (SP): aulas sobre a Constiuição em escolas públicas
O advogado Felipe Neves, 27 anos, passou a dar aulas como voluntário a jovens do ensino público quando sua diarista lhe contou que faltavam professores na escola da filha dela, no Jabaquara, zona sul de São Paulo.
Professor assistente da PUC-SP e especialista em direito comercial, resolveu enfocar a Constituição nas aulas. “Muitos deles estão indignados com os políticos e querem entender o que estão vendo nos jornais, na TV. Somos apartidários e damos conhecimento e informação para que eles possam desenvolver o pensamento crítico.”
O Projeto Constituição cresceu e hoje engloba 300 alunos em quatro escolas de ensino médio. Neves diz estar recrutando professores, arrecadando fundos e negociando com a prefeitura paulistana para tentar expandir o programa para toda a cidade.
“O Brasil é um país que tem muita gente sugerindo, criticando e pouca gente fazendo. É difícil começar uma organização social porque ninguém quer sair da zona de conforto”, afirma.
Murillo Sabino (RJ): moradias para pessoas em situação de rua
Após trabalhar na Coca-Cola, o engenheiro de produção Murillo Sabino, 27 anos, fundou uma ONG que busca reduzir o número de pessoas que moram nas ruas do Rio de Janeiro, o Projeto Ruas.
A organização tenta envolver nos trabalhos as comunidades que convivem com essas pessoas, conectando-as com centros de reabilitação para dependentes, defensores públicos e assistentes sociais.
“Entramos nos bairros e promovemos workshops sobre como falar com essa população, para que os moradores atuem permanentemente com ela.”
Em outra frente, a organização busca parcerias com empresas e governos para testar no Brasil um projeto inspirado no programa Housing First, adotado nos Estado Unidos. O programa inovou ao oferecer moradias individuais para pessoas em situação de rua imediatamente, em vez de levá-las a abrigos ou centros para dependentes. Em contrapartida, os beneficiados se comprometem a assumir o aluguel das residências em alguns meses.
Sabino afirma que, entre os atendidos pelo programa em Kansas City (EUA), o número de pessoas nas ruas caiu de 2 mil para 33.
Ystallone Alves (RN): monitoramento de pequenos rebanhos
Formado em análise e desenvolvimento de sistemas em Natal, Ystallone Alves, 27 anos, criou um software que permite o monitoramento de pequenos e médios rebanhos. Disponível em smartphones ou no computador, a ferramenta Agromarra registra dados como peso, doenças e vacinas, ajudando os proprietários a tomar decisões sobre o melhor momento para a venda e o cruzamento dos animais.
Alves conta que, embora grandes pecuaristas já utilizem tecnologias semelhantes, os demais criadores brasileiros costumam a armazenar dados sobre os rebanhos em papel e a tomar muitas decisões na base do achismo, o que gera prejuízos.
Ele diz que hoje há mais clientes esperando para aderir ao sistema do que sua empresa consegue atender. Alves planeja liberar a venda do sotfware para o público geral até abril e, para isso, corre atrás de investidores que apoiem o projeto.
Iluska Vieira (RJ): orientação profissional para estudantes
Nascida em Nova Friburgo (RJ) há 30 anos, Iluska Vieira fundou em 2015 a Pranah, que auxilia alunos do ensino médio a escolher sua profissão. Ela diz que não se trata de uma orientação vocacional tradicional, mas de um trabalho mais aprofundado, baseado na análise das competências e fraquezas de cada estudante.
“Dizemos como ele pode aprender melhor, se deve fazer grupos de estudo, se deve conversar com o professor, em quais áreas profissionais terá mais facilidade e em quais precisa se desenvolver”, afirma Vieira, que se formou em comunicação e marketing e antes trabalhava com recursos humanos.
Ela atende alunos de escolas privadas, que pagam pelos serviços, e de escolas públicas, em parceria com fundações.
Numa das iniciativas, financiada pela Brazil Foundation, passou um semestre numa escola pública em Barra Mansa (RJ). No período, levantou informações sobre os tipos de trabalho, faculdades e cursos técnicos disponíveis na região e orientou os alunos sobre como escrever currículos e se portar em entrevistas.
Ela diz que, em seis meses de trabalho, os alunos tiveram melhora de 20% numa avaliação de cinco competências. Vieria busca agora automatizar parte do serviço para que mesmo alunos de escolas que não participem da parceria possam acessá-lo, além de formar professores para que disseminem o projeto.
Guilherme Franco (MG): turismo em favelas e comunidades ribeirinhas
Nascido em Ouro Fino (MG) e formado em administração na FGV-SP, Guilherme Franco criou a agência [un]tourism, que promove o turismo em pequena escala em áreas com pouca visibilidade e estrutura, como favelas ou comunidades ribeirinhas na Amazônia.
Franco visita essas comunidades e as orienta sobre como receber os turistas. O público principal, segundo ele, são “estrangeiros que procuram uma experiência autêntica e têm dificuldade de encontrá-la no Brasil”.
Os locais selecionados são promovidos no site da agência, que faz a ponte entre os moradores e os clientes. Depois da viagem, os turistas podem avaliar a experiência. Uma das casas listadas fica na favela Paraisópolis, em São Paulo.
O administrador diz que o turismo pode ajudar as comunidades a se sustentar, mas que é preciso cuidado para evitar que a atividade se torne “pasteurizada e predatória”. “Não é para ser de forma alguma um safári”, ele diz.
Fonte:BBC Brasil