Passagem comprada, check-in feito, embarque autorizado. Dodi Leal, artista e educadora de 32 anos de idade, estava prestes a viajar pela Avianca, na última segunda-feira, 26, de Guarulhos (SP) para Recife (PE) quando, de dentro da aeronave, viu a Polícia Federal obrigá-la a se retirar.
Quando comprou a passagem, Dodi identificou-se pelo nome social: Dodi Leal. Ao fazer o check-in, ela apresentou seu RG, em que ainda consta o nome ao qual foi designada ao nascer. Apesar de um funcionário da Avianca ter autorizado o embarque, exatamente como manda o Decreto nº 8.727*, promulgado pela ex-presidente Dilma Rousseff em 28 de abril de 2016, a empresa insistiu em retirá-la do avião.
“A companhia aérea queria retirar o meu nome social de seus registros e me embarcar como homem, foi a maior humilhação. A empresa disse que a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) deveria orientar sobre o uso de nome social. Pasmem: a Anac também desconhecia o decreto sobre o nome social! A hipocrisia da companhia aérea foi proferir a argumentação: ‘só vamos mudar alguma coisa se recebermos instruções de regimentos da aviação’.”, conta Dodi ao Catraca Livre.
Dodi afirma que, após o voo, não foi redirecionada para outro. “Eu tive que pedir intervenção da Polícia Civil e da Anac para a companhia aérea tomar providências. Na Anac dei entrada com denúncia e o desdobramento deve ser o processo administrativo com a Avianca. Além disso sugeri que a Anac orientasse todas as cias aéreas imediatamente sobre o uso de nome social de pessoas trans. A Polícia Civil emitiu um documento reconhecendo minha identidade de gênero e meu nome social e apenas com este documento, muita humilhação e muito enfrentamento, a cia aérea permitiu meu embarque”.
Apesar de ter conseguido embarcar, o outro voo só saiu após 17 horas que fez o check-in. “Foram 17 horas sem suporte. A Avianca descumpriu a regra da Anac de providenciar assistência material neste período. Fui exposta para o aeroporto inteiro”, relata.
A educadora ainda conta que essa viagem seria necessária para ajudar em seu processo de transição de gênero. “Ter coragem de sair na rua e encarar a sociedade já é um desafio que eu tenho que me conciliar comigo mesma. É gigante dar um passo e dizer para mim mesma: ‘eu vou sair, eu vou viajar’. Chegar ao aeroporto e ter que passar por isso é destruidor para o meu processo”, desabafa.
Em nota oficial ao Catraca Livre, a Avianca explicou seu lado da história:
“A Avianca Brasil esclarece que a Resolução 130 da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) determina que o embarque de passageiros só seja realizado após a conciliação dos dados de um documento de identificação válido com os da reserva e/ou do cartão de embarque. Este é um procedimento de segurança aplicado no setor aéreo, não apenas no Brasil como em todo o mundo.
No caso em questão, houve discrepância entre as informações apresentadas e, como a cliente alegou ainda não possuir documento emitido com seu nome social, o embarque precisou ser negado. A companhia ressalta que ofereceu reacomodação em um próximo voo disponível, a fim de que fosse providenciada uma reconciliação dos dados no próprio aeroporto.”
*”Os órgãos e as entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, em seus atos e procedimentos, deverão adotar o nome social da pessoa travesti ou transexual, de acordo com seu requerimento e com o disposto neste Decreto”.
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Fonte:Estadão